quarta-feira, 28 de setembro de 2011

A comunicação do Governo, segundo Alda Telles


“(…) As declarações dos ministros parecem mais preparadas e controladas. Não sei se existe a falada ‘central de comunicação’ do Governo, como se falava no anterior executivo, mas o ministro [Miguel] Relvas lidera claramente uma equipa de especialistas em comunicação, designadamente assessores e consultores com experiência política e, facto interessante, de diferentes quadrantes políticos.”

“Naturalmente, os ministros que vêm da política e do Parlamento têm maior preparação e eficácia na comunicação mediática, sobretudo em termos do terrível e impiedoso meio que é a televisão. Cabem aqui, portanto, os ministros do CDS – Portas, Cristas e Mota Soares. Nos “não-políticos”, Nuno Crato tem boas capacidades de passar a mensagem, utiliza uma linguagem pouco hermética que consegue criar alguma empatia.”

“Os ministros das Finanças e da Economia acumulam ambos as características de serem académicos e gerirem as pastas com maior impacto e escrutínio. Têm, por isso, uma maior exposição sem terem a necessária preparação. Penso mesmo que a surpresa e algum élan positivo que Vítor Gaspar conseguiu gerar pela sua postura singular não terá garantias de continuar a funcionar…”

“O primeiro-ministro tem conseguido gerir habilmente sua comunicação individual e a sua relação com os media, ao manter um certo distanciamento da agenda mediática e delegando a maioria dos anúncios de austeridade nos seus ministros. Digamos que os ‘focal points’ da análise mediática, e até política, têm sido os membros do governo, com particular destaque para o ministro das Finanças, pelo papel crucial do seu ministério. Esta estratégia tem evitado o desgaste de imagem de Passos Coelho, que tem preferido orientar-se para a política e os media internacionais. (…) Parece-me que o primeiro-ministro tem conseguido demarcar a sua imagem da imagem do colectivo a que preside.”

“Existe uma máxima em comunicação que aconselha a que as más notícias sejam dadas de uma só vez e as boas em pequenas doses regulares. Claramente, o governo não optou por segui-la, atribuindo ao ministro das Finanças o ingrato papel de anunciar sucessivas medidas de aumentos de impostos. Contudo, esta metodologia contém uma realidade e um ponto forte. A realidade é que as medidas necessárias ainda não estão suficientemente conhecidas e apenas se pode gerir a sua expectativa (o que tem sido, neste aspecto, conseguido). O ponto forte é a consistência do discurso de austeridade que tem permitido uma boa gestão das (más) expectativas. O anúncio recente pelo ministro da “normalização” da economia a partir de 2012 foi, neste sentido, um movimento arriscado.”

“Outro ministro que terá muitas dificuldades em fazer passar a sua mensagem é o titular da Saúde. A política anunciada de “moralização” da despesa e a responsabilização dos dirigentes do sector, baseada essencialmente na divulgação de números catastrofistas para o SNS, não será suficiente para evitar o sentimento de degradação dos cuidados de saúde, que a maioria dos portugueses encara como um direito absoluto. Uma pasta muito sensível, e muito exposta a oposições políticas, resistências profissionais e protestos populares. Todas as medidas neste sector têm de ser comunicadas nas suas duas dimensões: a dimensão financeira, que o ministro domina bem, e a dimensão da responsabilidade social do Estado nesta matéria, que o discurso do ministro tem de interiorizar.”

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